terça-feira, 6 de novembro de 2012

Contribuindo com o estudo - Gêneros e Suportes


A resenha de hoje é sobre o ensaio escrito em 2003 pelo professor doutor Luiz Antônio Marcuschi, da Universidade Federal de Pernambuco, sob o título “A questão do suporte dos gêneros textuais”

Nesse ensaio (é importante lembrar que ensaio é um gênero textual que não comunica resultados prontos e acabados de pesquisa, mas reflexões iniciais sobre ela), Marcuschi reflete sobre o conceito de suporte de gêneros textuais e sua relação com outros conceitos desenvolvidos pelos estudiosos da língua, ressaltando o caráter inicial de suas colocações e convidando outros estudiosos da área a pensarem com ele sobre os suportes, ou seja, sobre os lugares onde os gêneros são colocados para circular, como por exemplo um livro, um jornal, um cartaz.

Ele começa dizendo que a tese central da análise que apresenta no ensaio, “é a de que todo gênero tem um suporte, mas a distinção entre ambos nem sempre é simples...” e que “a identificação do suporte exige cuidado.” Logo em seguida, o autor alerta seus leitores: ele não quer fazer uma classificação de todos os tipos de suporte que possam existir. O que ele deseja é refletir sobre como eles contribuem para a apresentação dos gêneros e se os suportes podem interferir na formação dos gêneros textuais. Logo em seguida, Marcuschi começa a apontar alguns tipos de suporte que, desde tempos muito remotos até hoje, estão ligados à circulação de gêneros textuais.

“Seria interessante observar como desde a antiguidade os suportes textuais variaram, indo das paredes interiores de cavernas à pedrinha, à tabuleta, ao pergaminho, ao papel, ao outdoor, para finalmente entrar no ambiente virtual da Internet. Mas este é um roteiro de análise que não será aqui percorrido.Com efeito, nossa sociedade foi das inscrições rupestres à pichação urbana, um caminho curioso que sugere inúmeras interpretações e não necessariamente uma evolução.Uma observação preliminar pode ser feita a respeito da importância do suporte.”

“Ele é imprescindível para que o gênero circule na sociedade e deve ter alguma influência na natureza do gênero suportado. Mas isto não significa que o suporte determine o gênero e sim que o gênero exige um suporte especial. Contudo, essa posição é questionável, pois há casos complexos em que o suporte determina a distinção que o gênero recebe. Tome-se o caso deste breve texto: 'Paulo, te amo, me ligue o mais rápido que puder. Te espero no fone 55 44 33 22. Verônica .' Se isto estiver escrito num papel colocado sobre a mesa da pessoa indicada (Paulo), pode ser um bilhete; se for passado pela secretária eletrônica é um recado; remetido pelos correios num formulário próprio, pode ser um telegrama; exposto num outdoor pode ser uma declaração de amor. O certo é que o conteúdo não muda, mas o gênero é sempre identificado na relação com o suporte. Portanto, há que se considerar este aspecto como um caso de co-emergência, já que o gênero ocorre (surge e se concretiza) numa relação de fatores combinados no contexto emergente.”

Além de discutir diversos tipos de suporte em sua relação com os gêneros textuais, Marcuschi os distingue de locais de armazenamento de suportes, como as bibliotecas, os canais ou meios de condução de um gênero, como o telefone, a Internet e os pára-choques de caminhão. No que diz respeito aos gêneros textuais orais, o autor é bastante cauteloso: ele acha que a discussão sobre a relação entre gêneros e suportes ainda está no início, o que não dá fundamentos suficientes para analisar suportes de gêneros orais.

Na sequência de seu ensaio, Marcuschi apresenta uma série de conceitos relacionados com a questão que discute. Como esses conceitos são utilizados continuamente pelos professores que ensinam língua, reproduzimos a seguir alguns deles, por considerar que contribuem para a compreensão não só do assunto que o autor discute, mas para a prática do professor.

Texto

Trata-se, num primeiro momento, do objeto linguístico visto em sua condição de organicidade e com base em seus princípios gerais de produção e funcionamento em nível superior à frase e não preso ao sistema da língua; é ao mesmo tempo um processo e um produto, exorbita o âmbito da sintaxe e do léxico, realiza-se na interface com todos os aspectos do funcionamento da língua, dá-se sempre situado e envolve produtores, receptores e condições de produção e recepção específicas. Em essência, trata-se de um evento comunicativo em que aspectos linguísticos, sociais e cognitivos estão envolvidos de maneira central e integrada, como observou Beaugrande (1997).

Discurso

De uma maneira geral, o discurso diz respeito à própria materialização do texto e é o texto em seu funcionamento sócio-histórico; pode-se dizer que o discurso é muito mais o resultado de um ato de enunciação do que uma configuração morfológica de encadeamentos de elementos linguísticos, embora ele se dê na manifestação linguística. É uma materialidade de sentido.

Gênero (textual, de texto, discursivo, do discurso)

Trata-se de textos orais ou escritos materializados em situações comunicativas recorrentes. Os gêneros textuais são os textos que encontramos em nossa vida diária com padrões sócio-comunicativos característicos definidos por sua composição, objetivos enunciativos e estilo concretamente realizados por forças históricas, sociais, institucionais e tecnológicas. Os gêneros constituem uma listagem aberta, são entidades empíricas em situações comunicativas e se expressam em designações tais como: sermão, carta comercial, carta pessoal, romance, bilhete, reportagem jornalística, aula expositiva, notícia jornalística, horóscopo, receita culinária, bula de remédio, lista de compras, cardápio de restaurante, resenha, edital de concurso, piada, conversação espontânea, conferência, e-mail, bate-papo por computador, aulas virtuais e assim por diante. Como tal, os gêneros são formas textuais escritas ou orais bastante estáveis, histórica e socialmente situadas.

Tipo (textual, de texto, de discurso)

Esta noção designa muito mais modalidades discursivas ou então sequências textuais do que um texto em sua materialidade. O tipo textual define-se pela natureza linguística de sua composição {modalidade, aspectos sintáticos, lexicais, tempos verbais, relações lógicas, estilo, organização do conteúdo etc.}. Em geral, os tipos textuais abrangem um número limitado de categorias conhecidas como: narração, argumentação, exposição, descrição, injunção. Quando predomina uma característica tipológica num dado texto concreto dizemos que esse é um texto argumentativo ou narrativo ou expositivo ou descritivo ou injuntivo. Os tipos textuais constituem modos discursivos organizados no formato de sequências estruturais sistemáticas que entram na composição de um gênero textual. Tipo e gênero não formam uma dicotomia, mas se complementam na produção textual.

Como o leitor pode constatar, a discussão é interessante e exige aprofundamento por parte de quem queira se envolver nela. Mas, como professores são principalmente eternos estudantes, aí fica a sugestão de leitura para esta semana. 
 Heloisa Amaral



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